As enchentes de maio de 2024 foram, se não a maior, uma das mais graves catástrofes climáticas já registradas no Rio Grande do Sul – com vidas perdidas e destruição material de proporções inimagináveis, atingindo 95% dos municípios gaúchos. O reflexo econômico dessa catástrofe foi devastador – com impacto no PIB previsto em R$ 80 a R$ 120 bilhões – deixando o RS com uma conta dificílima de pagar. Mas não impossível.
Buscando identificar os caminhos e os protagonistas para a recuperação e retomada do desenvolvimento econômico gaúcho, a Federação Varejista do RS promoveu o I Fórum Estadual do Comércio no dia 12 de agosto, em Porto Alegre. Cerca de 180 pessoas acompanharam a programação na Associação Leopoldina Juvenil, que reuniu lideranças políticas, entre elas o Governador Eduardo Leite; setoriais e especialista em um circuito de debates.
“Estamos aqui para encontrar caminhos que nos permitam reconstruir o estado do Rio Grande do Sul, fortalecer o comércio tão severamente impactado por essa catástrofe, reestruturar o setor de serviços. O Fórum vem com esse grande propósito e convida a cada um para seremos, juntos com a Federação Varejista, os protagonistas da construção de um futuro mais próspero para nosso querido Estado”, disse o Presidente da Federação Varejista do RS, Ivonei Pioner.
Nesse desafio, o Governador Eduardo Leite destacou, em sua explanação com o tema ‘Reerguendo o nosso Rio Grande’, pontos-chave do programa de mesmo nome e a importância da governança bem estruturada, envolvendo a sociedade civil, de modo que as trocas de mandado não gerem descontinuidade nesse trabalho de reconstrução – que envolve ações de médio e longo prazo. “Outro ponto é entender o papel de Governo enquanto responsável por liderar esse processo, alcançando ferramentas para tal. Mas o Governo não será a resposta para tudo, a parceria com o setor privado é fundamental para se ter amplificada a capacidade de reconstrução do Rio Grande do Sul. A recuperação do Estado está na base produtiva”, disse.
Leite compartilhou algumas das ações relacionadas ao plano de reconstrução consistente em andamento para o Estado. Com respostas ágeis, espera reduzir em até três vezes o tempo para a recuperação. “Temos muito otimismo com relação à reconstrução do RS. É uma tarefa difícil, mas a força e resiliência do povo gaúcho já se expressam nesse momento com muito vigor, e estamos trabalhando também em novos programas, em financiamentos para setores econômicos que ajudarão na recuperação, de modo que seja possível retomar de forma rápida a economia do Estado, sem deixar ninguém para trás e colocando todos para frente”, destacou.
Políticas públicas de apoio à reconstrução do RS
A agenda de trabalho do Fórum abriu com o painel sobre Políticas públicas de apoio à reconstrução do RS, reunindo a deputada federal Any Ortiz, o deputado estadual Guilherme Pasin e o presidente da Famurs, Marcelo Arruda. Uma das tônicas do debate foi a crítica ao Governo Federal, moroso no repasse de auxílios efetivos ao RS.
“A União foi lenta e negou a ajuda que o RS, quarta economia federal, precisava. Quem está salvando o Rio Grande do Sul foi o setor produtivo, que leva o Estado nas costas; as empresas, junto às entidades e à sociedade, que se mobilizaram para ajudar as famílias vitimadas pelas enchentes, os empreendedores a retomar os negócios”, disse Any.
É fato que o Brasil está esquecendo a dor do RS, na opinião de Pasin. “Enquanto isso vemos milhares de empreendedores com negócios fechados. Falta empatia por parte do Governo Federal e, também, por parte do Estado, enrijecimento da postura para defender os seus, e ainda bem que Governador aumentou o tom das cobranças junto à União”, destacou o parlamentar. “Só superaremos a dor que estamos vivendo se nos unirmos em cobranças, pois o que está em jogo é o futuro do Estado, da sociedade gaúcha, e se não houver soluções imediatas de socorro, ele será triste”, disse o deputado.
Tão importante quanto buscar essas medias é trabalhar a reconstrução de forma alinhada com a prevenção, na avaliação de Arruda. “Por um lado, tivemos um cenário de perdas muito impactante, que impôs aos municípios uma série de desafios. Um deles é, sem dúvida, encontrar formas de adaptar as cidades, criar nesses locais um ambiente seguro para que os investimentos continuem vindo, pois sem eles, não há economia e nem arrecadação”, disse.
Nesse sentido, Pasin também pontuou sobre a criação de uma Comissão Especial de Desenvolvimento Econômico do RS, da qual é proponente e presidente, que está coletando sugestões dos aspectos que mais afetam a vida do empreendedor: quais os entraves por parte do setor público que vêm machucando a velocidade do desenvolvimento. “Vamos propor alternativas para ter um estado mais agradável, afável e torcedor dos empreendedores e empregadores que movimentam a economia. Esse é o caminho único para o desenvolvimento do RS”, disse Pain.
O painel trouxe, ainda, uma reflexão sobre o uso do dinheiro público – ou seja, do contribuinte pagador de impostos. “Não se pode gastar mais do que se arrecada porque a alternativa é, sempre, aumentar impostos, em uma carga tributária que já é alta e não é devolvida aos cidadãos, por meio da oferta de serviços, com a qualidade que deveria ter”, destacou a deputada Any.
Carga Tributária e Competitividade no Comércio
O segundo painel do fórum trouxe a pauta da Carga Tributária e Competitividade no Comércio, com os deputados estaduais Rodrigo Lorenzoni, presidente da Frente Parlamentar da Liberdade Econômica; Felipe Camozzato, presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo e da Desburocratização; e a economista Maria Carolina Gullo.
Coube a ela trazer dados que mostraram o panorama gaúcho, estado com 11 milhões de pessoas e uma condição econômica média melhor do que a observada no cenário nacional. No contexto produtivo, Maria Carolina observou que 61% do PIB gaúcho está correlacionado ao setor de serviços, e que o comércio responde por 14% na geração de riqueza. No que tange à mão de obra, 66% da força de trabalho do Estado está concentrado no comércio (23%) e serviços (43%). A especialista relembrou outro ponto importante “Embora o RS tenha um ICMS maior do que outros estados, em percentuais aproximados, 68% da arrecadação fica com a União; 26% para os estados e menos de 7% para os municípios. A questão da carga tributária, hoje em 34%, é que o retorno devolvido à sociedade não é o que gostaríamos pela proporção do que é arrecado”, disse.
Um dos fatores que implica em perda de competividade para os negócios, a carga tributária não vem sozinha nessa balança. “Também é preciso considerar fatores como a alta taxa de juros, que impacta na decisão de investir ou não; a inflação elevada, que resulta em perda do poder aquisitivo do consumidor, e o câmbio acima do que deveria estar. Tudo interfere na decisão sobre novos investimentos”, ensinou.
O caminho para reverter esse cenário é a melhoria do ambiente de negócios, na avaliação de Lorenzoni. “Precisamos romper o ciclo que impede o aumento de receita, ou seja, gerar condições para o desenvolvimento econômico sustentável; com equilíbrio fiscal, com aquecimento da atividade econômica e não com o alargamento da máquina estatal”, disse.
Combater o negacionismo econômico também é um movimento importante, na opinião de Camozzato. “A melhora da competitividade não vai acontecer sozinha, ela depende de investimentos, como em modais de transporte, infraestrutura, combate aos maus indicadores fiscais, que afugentam investidores. O excesso de despesas, o fato de ser um Estado que gasta muito e gasta mal, é a tragédia do Rio Grande do Sul”, disse.
Impulsionando o Empreendedorismo, as Micro e Pequenas Empresas
O último painel do Fórum veio com o tema Impulsionando o Empreendedorismo, as Micro e Pequenas Empresas, de grande relevância em um Estado que possui um 1,450 mil empresas ativas, das quais 52,3% são MEIs, 34,3% são microempresas e 6% são empresas de pequeno porte. Para debater, os deputados estaduais Elton Weber, presidente da Frente Parlamentar em Defesa das Micro e Pequenas Empresas no Estado do Rio Grande do Sul; Delegada Nadine, presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo Feminino e da Força da Mulher Gaúcha, e Patrícia Alba, presidente da Frente Parlamentar em defesa do Comércio de Bens e Serviços, compartilharam o palco.
Em sua explanação, Weber apresentou sugestões de busca de políticas permanentes de Estado que perpassem por searas como gestão, crédito e microcrédito, mercado e formação empresarial e do empreendedorismo. “É importante descobrir de que forma o poder público pode ser fomentador do desenvolvimento junto com o setor privado, usando a experiência de ambos para avançar e construir mais do que já existe”, disse.
Acreditando que o desenvolvimento econômico precisa ser alavancado pelo empreendedorismo e pela iniciativa privada, Patrícia defende a criação de um ambiente que estimule a juventude a empreender. “Precisamos trazer para a sala de aula o conhecimento do empreendedorismo, mostrar para os jovens o que eles podem fazer e como pode ser a vida deles com esse movimento”, disse.
Essa proposta vem acompanhada de uma reflexão feita pela Delegada Nadine, de que sem independência financeira não se chega a nenhum lugar, por isso da importância de incentivar o empreendedorismo. “Homens e mulheres, com suas diferenças e suas características, podem e devem trabalhar juntos para fazer um Rio Grande do Sul ainda maior”, conclamou.
Unidos por um propósito
Imbuída do papel de promover ações para desenvolver o varejo gaúcho, a Federação Varejista do RS idealizou, no I Fórum Estadual do Comércio, a reunião de lideranças setoriais e do poder público a fim de desenhar o futuro do segmento em um encontro que teve como tema "Caminhos e Protagonistas do RS". “Na mesma medida que as enchentes nos apresentaram uma situação caótica, essa catástrofe teve, sim, um ponto positivo que nós precisamos enaltecer: essa dificuldade extrema serviu para nos lembrar da força da solidariedade, do poder transformador que a união de esforços em torno de uma mesma causa tem”, disse o Presidente da Federação Varejista do RS, Ivonei Pioner.
Esse chamamento para o engajamento foi um dos destaques evidenciados pela entidade promotora do encontro. “Nosso propósito maior é o de encontrar formas de recolocar o Rio Grande do Sul na trajetória do progresso, e somos todos agentes da transformação que precisamos e queremos ver ocorrendo no estado. Por isso, as discussões e reflexões de hoje são fundamentais para traçar as rotas que levarão à reconstrução e ao fortalecimento do comércio gaúcho”, disse a Diretora de Relações Institucionais e Governamentais da Federação Varejista, Clarice Strassburger.
Se esse olhar crítico e esse planejamento estratégico já eram importantes, depois do desastre climático de maio tornaram-se urgentes, na opinião dela. “Ao passo que precisamos de um olhar de amparo e assistência às vítimas dessa tragédia, que estão ainda muito longe de estarem vivendo suas vidas com normalidade, precisamos incluir em nossas ações uma visão estratégica de futuro, que permita e oportunize a essas pessoas reconstruir sua dignidade. Este fórum é apenas o começo de um longo caminho de reconstrução que nós, cidadão, políticos, lideranças, precisamos protagonizar, unindo os esforços da iniciativa privada, das entidades representativas, dos poderes públicos – em uma única missão, que é a de ajudar o Rio Grande do Sul a emergir mais forte do que nunca”, destacou.
O I Fórum Estadual do Comércio teve o patrocínio de Central de Seguros e Federação UNIMED, e o apoio institucional de AMICRO, Associação de Microempresas e Empresas de Pequeno Porte; Frente Parlamentar do Comércio de Bens e Serviços; Frente Parlamentar do Empreendedorismo e da Desburocratização; Frente Parlamentar em Defesa das Micro e Pequenas Empresas; Frente Parlamentar para Acompanhamento da Reforma Tributária Nacional.