Apresentada na Escola Estadual de Ensino Médio Dr. João Caruso entre os dias 22 e 25 de abril, a exposição itinerante “Elas Não Estão Mais Aqui” propõe uma reflexão profunda e necessária sobre o feminicídio, promovida pelo Coletivo Ecofeminista do Alto Uruguai (CEFAU) e conduzida pelo projeto extracurricular “Elas”. Idealizada como uma ação pontual para o mês de agosto, acabou sendo antecipada após o trágico feriadão de Páscoa que registrou dez feminicídios no Rio Grande do Sul.
A urgência falou mais alto
Coordenada pela professora Roberta Manica e pelas estudantes Marina Eduarda Rossetto e Júlia Trindade Lima, do terceiro ano do Ensino Médio, a exposição reúne nomes e histórias das vidas de mulheres assassinadas em contextos de violência de gênero. O material foi inicialmente apresentado na Esquina Democrática, no centro de Erechim, durante o Dia Internacional da Mulher.
“As pessoas diziam: ‘Vocês têm coragem de fazer isso’. Mas por que falar sobre a realidade das mulheres precisa ser um ato de coragem?”, questiona a professora Roberta. “Não queremos ser vistas como corajosas. Nós queremos mudança.”
Um projeto que escuta, acolhe e forma
Criado em 2020, o projeto “Elas” surgiu como uma iniciativa voltada às meninas do Ensino Médio, com o objetivo de abordar temas como empoderamento, violência de gênero, direitos das mulheres e feminismo. Com o tempo, ganhou força, envolveu estudantes do Ensino Fundamental e passou a incluir os meninos em suas atividades, criando espaços de escuta e construção coletiva.
“Mais do que falar para as meninas, queremos conversar com todos”, explicam Marina e Júlia. “É um projeto para que toda a comunidade escolar compreenda o que é o feminicídio, quem foi Maria da Penha, e o que significa respeito.”
Segundo as estudantes, hoje, o projeto soma mais de 50 encontros, palestras, rodas de conversa e participações em eventos como a Semana Maria da Penha, em Porto Alegre, e a mostra na UFFS Sem Fronteiras. Em 2025, recebeu destaque por seu uso de tecnologia e pelo alcance entre os jovens.
Impacto direto na comunidade
A exposição “Elas não estão mais aqui”, montada na entrada da escola, impressionou pela força dos dados e das imagens. QR Codes espalhados pelos painéis permitiram que as famílias levassem as reflexões para casa.
“Foi um choque. Ver a idade das vítimas, o que estavam vestindo, saber que algumas eram mães, outras adolescentes... Nos sentimos próximas dessas mulheres. Foi um chamado à empatia e à sororidade”, relataram as alunas do terceiro ano.
A diretora da escola, Aline Jacoboski Bianqui, falou sobre o papel fundamental da exposição como ferramenta educativa e transformadora. “Essa mostra veio como um tratamento de choque necessário. Ensinar nossas meninas a reconhecerem seu valor e se defenderem começa aqui, na escola”, menciona a diretora.
Um espaço seguro para denúncias e escuta
Além do impacto coletivo, o projeto tem sido um espaço seguro onde estudantes podem se abrir. “Precisamos criar espaços onde as meninas possam se sentir seguras para falar. Não como uma palestra, mas como uma conversa entre amigas. É nesse ambiente que o projeto ganha sua força”, afirma Marina.
O comitê do projeto “Elas” é atualmente composto por quatro alunas, com apoio contínuo da professora Roberta Manica. Meninos também participam das atividades, embora não façam parte do comitê. Entre os projetos com estudantes mais jovens, uma das ações mais marcantes é o "semáforo do corpo", uma dinâmica que ensina as crianças sobre seus limites e o respeito ao próprio corpo.
“Queremos que isso continue. Que outras meninas aprendam, se envolvam e passem esse conhecimento adiante. É um legado que queremos deixar para as próximas gerações”, diz Júlia.
Exposição “Elas não estão mais aqui”: um memorial silencioso
A mostra propõe uma reflexão profunda e necessária sobre o feminicídio, por meio de uma instalação artística com forte carga simbólica. A exposição apresenta histórias reais de mulheres que tiveram suas vidas brutalmente interrompidas por seus companheiros ou ex-companheiros. Cada uma é simbolicamente representada por um par de calçados femininos, cuidadosamente posicionados para marcar a ausência física e, ao mesmo tempo, manter viva a memória de suas existências.
Os calçados, silenciosos e estáticos, tornam-se poderosas metáforas da ausência, da interrupção de trajetórias e da dor deixada para trás. Ao caminhar entre os pares expostos, o visitante é convidado a refletir sobre as vidas perdidas e sobre o impacto do machismo e da violência de gênero na sociedade.
Ao percorrer diferentes espaços, ela busca dar visibilidade a essa triste realidade e fomentar o debate sobre a importância da prevenção, do acolhimento às vítimas e da construção de relações baseadas no respeito e na igualdade. De acordo com a professora Roberta Manica, na próxima semana a exposição itinerante estará disponível na Câmara de Vereadores de Erechim.