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Expressão Plural

Que tiro foi esse? (The Last of Us)

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Gerson Egas Severo
Por Gerson Egas Severo
Foto Arquivo Pessoal

O episódio de “The Last of Us” de que todo mundo está falando (e chorando), o segundo episódio da segunda temporada da série de televisão, ido ao ar no domingo passado, chama-se “Through de Valley”. Quero escrever a respeito disso, está bem? Mas, antes, precisamos de uma contextualização.

            “The Last of Us” (o último de nós, os últimos de nós; a última de nós?) é um jogo eletrônico que se passa em um ambiente pós-apocalíptico lançado, a parte I, em 2013, e a parte II em 2020. Em 2023, tornou-se a aclamada série de televisão com Pedro Pascal e Bella Ramsay, que hoje está em sua segunda temporada. Para que o caro leitor/a entenda o que está acontecendo, o jogo eletrônico está sendo adaptado em filme quase que de modo exato: quem conhece o jogo (diretamente ou pelas redes sociais), sabe de antemão quase tudo o que irá acontecer – o que já constitui um fenômeno específico de consumo de mídias por si só.... E o resultado é uma série que bem provavelmente estará entre as mais bem realizadas e apreciadas da história.

            Bem: vejamos como se dá o mergulho desse tipo de produto cultural em um caldeirão de referências mais amplo – tornando a experiência do jogo e da série uma experiência realmente rica, desde que se saiba procurar e achar as pérolas. No episódio em questão – este que vem sendo super comentado, e que se chama, então, “Pelo vale”, ou “Através do vale” -, a menina Ellie, uma das protagonistas, sofre uma perda brutal (que todo mundo já sabia que iria sofrer, desde 2020, com o lançamento da segunda parte do jogo. Mesmo assim...).

            No fim desse episódio, consumada a perda, surge como trilha sonora uma canção também chamada “Through the Valley”, de Shawn James (2012), interpretada pela atriz que, na série, interpreta a mãe (já falecida) de Ellie, Ashley Johnson. A música já aparecia no jogo. Se o episódio-piloto se intitulava “When you’re lost in the darkness” (Quando tu estás perdido/à na escuridão), este se chama “Através do vale” – e é que como se a mãe de Ellie (Cassandra de Troia?) estivesse predizendo o destino de sua filha, soprando-lhe o salmo: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo.” E o salmo chega, está vindo, encontra-se ali, mas irremediavelmente alterado, quando Joel (o “pai”) não está mais. E Deus – naquele universo? Eis uma questão...

            Entretanto, conhecemos Ellie – sabemos da seriedade, da gravidade de seu grito de vingança. E é então que o salmo, em um jogo de intertextualidade, se mistura com a letra da canção de Shawn James, numa supernova de sentidos:

            “Eu caminho pelo vale da sombra da morte/ E eu não temo nenhum mal, porque estou cego para tudo/ E minha mente e minha arma me confortam/ Porque eu sei que liquidarei meus inimigos quando eles vierem/ É certo que a bondade e a misericórdia estarão comigo em todos os dias da minha vida/ E eu habitarei esta terra para sempre/ Eu ando junto das águas, elas restauram a minha alma/ Mas não posso percorrer a senda dos justos – porque estou errado/ Encontrei um sujeito no topo de uma colina/ Que dizia-se o salvador da raça humana/ E que tinha vindo para livrar o mundo de toda dor e destruição/ Eu perguntei: como o mundo pode ser salvo de si mesmo?/ Porque eu caminho pelo vale da sombra da morte/ E eu não temo nenhum mal, porque estou cego/ Sim, e eu ando junto das águas, elas restauram a minha alma/ Mas eu sei que, quando morrer, minha alma estará perdida.”

            As pessoas estão buscando, na estrutura narrativa dos jogos, respostas para o que está por acontecer. A música, porém, está soprando no vento as possibilidades de resposta – basta escutar: no caldeirão de referências mobilizado por jogo e série, e para além dele. A busca por respostas, afinal, é a própria e incessante busca humana por sentido(s). Nós: a espécie fabuladora, num vale que não tem fim.

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