Na semana passada, começamos a trazer, desenvolver, o tema do livro “Stand out of our Light: Freedom and Resistence in the Attention Economy”, de James Williams, publicado em 2018. “Saia (ou saiam) da nossa Luz: Liberdade e Resistência na Economia da Atenção”. Fizemos, no primeiro texto, um ensaio sobre a curiosa menção, na primeira parte do título, à célebre resposta de Diógenes de Sínope a Alexandre, o Grande, e à oferta de dar ao filósofo qualquer coisa que ele desejasse: apenas saia da frente da luz, estou tomando sol.
O livro de James Williams, que trabalhou no Google, é derivado de uma tese em Filosofia e trabalha a ideia de que as tecnologias digitais (redes sociais, streamings, publicidade), que de modo mais e mais consolidado ocupam o centro da vida humana nos tempos que correm, atravessando-a inapelavelmente, funcionam, também, como um instrumento de captura de nossa atenção – e, por conseguinte, de nosso olhar, de nosso desejo, de nosso... tempo. Nossa atenção, nossa capacidade de concentração e foco, foi reconhecida como um recurso econômico, relativamente escasso, no século XXI, e transformada em uma mercadoria como qualquer outra (“tudo que é sólido se desmancha no ar”). Há uma guerra contra nossa atenção.
Alguém poderia argumentar que, até aí, não há exatamente uma novidade – e é verdade, há outras obras, autores e autoras. Mas Williams vai além: as coisas estariam ocorrendo em um nível, e em uma progressão, uma escala, que a própria liberdade humana, o domínio de nossas escolhas, no sentido de tomar decisões sobre nossas vidas e os rumos da história, em uma palavra, nossa agência, estariam gravemente comprometidos. O sol de nossa liberdade está sendo obstaculizado – por quem? Sistemas “invisíveis”, o mais das vezes identificados como um vilão hipermoderno, uma megamente (um outro big brother?) nem sempre bem compreendida e chamada “O Algoritmo” (com o mesmo “A” de Alexandre”), irradiada, porém, de lugares bem humanos, demasiadamente humanos, estariam desenhando nossas decisões e desejos.
Nossa liberdade estaria perdendo “peso”, tornando-se manipulada e dissipada. Para Williams, teríamos a ilusão de sermos livres para fazer escolhas – quando, na verdade, faríamos essas escolhas no interior de uma ambiência pensada para controlar e dirigir essas escolhas. Nosso livre-arbítrio – seja o que o mesmo venha a significar – seria rearranjado, portanto, e nosso tempo livre, colonizado por um universo virtualmente infinito e imparável de estímulos em telas múltiplas nunca desligadas, nunca silenciadas. Williams afirma que nossa atenção vem sendo comprometida em diferentes momentos e temporalidades: a atenção imediata, concentração e foco pontuais, momentâneos; a atenção em nível médio, ligada a projetos de vida e à longa duração; e a atenção de “nível superior”, relacionada às linhas éticas e existenciais traçadas em termos sociais e históricos, que podem ultrapassar o tempo de uma vida humana.
Há, entretanto, algo de Diógenes em Williams. É preciso resistir – e resistir seria recuperar o nosso “espaço de luz”, que seria um espaço de compreensão, discernimento, presença e ação. Recuperar o nosso olhar, a consciência de nosso olhar e de o que estamos olhando. Um espaço a partir do qual não negaríamos as novas tecnologias, como ludistas extemporâneos (sem bem que...), mas trataríamos de proceder a uma ressignificação, uma reorientação ética e política das tecnologias. Assim, recuperaríamos a nossa atenção, reconquistaríamos nossa própria consciência, retomaríamos em mãos nossa liberdade. Essa resistência assumiria muitas formas – sendo a última considerada pelo autor, a chamada “resistência comunitária”, que incluiria o cultivo de “clubes do livro” – e, aí, confesso que o autor me pegou.
Na próxima coluna, continuaremos explorando o assunto em todas as direções, caro leitor/a. Está bem?