Ter um espaço para compartilhar... Sim, compartilhar sentimentos e experiências. Sem julgamentos ou conselhos, mas somente o espaço para desabafar e trocar ideias. Ali, no grupo, é possível verificar que muitas dificuldades, problemas e angústias, podem se tornar comuns, e, quando vistos de maneira conjunta, as reflexões e até mesmo soluções se tornam mais simples.
Assim é a rodaterapia, um projeto desenvolvido pelo Serviço de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Erechim. A reportagem do Bom Dia acompanhou um encontro na manhã de quinta-feira (28).
O atendimento é focado nas pessoas que enfrentam problemas como depressão, ansiedade, conflitos familiares, problemas de aprendizagem, fobias, entre outros. A psicoterapia pode ser realizada de forma individual e em grupos. Crianças, adolescentes e adultos são contemplados no serviço.
As pessoas são encaminhadas ao Ambulatório de Saúde Mental pelas UBS – Unidades Básica de Saúde, escolas municipais e estaduais, hospitais, Conselho Tutelar, Ministério Público, Poder Judiciário, Cras e Creas do município.
“Aqui é o lugar que me sinto muito bem”
Para algumas mulheres que estavam na reunião de grupo, o momento é muito importante e propicia muito bem-estar. Elas comentaram que enfrentam problemas como esquecimento, tristeza e contam com o apoio do grupo e da família para lidar com os desafios do cotidiano.
“O que me ajuda é a roda”, “aqui no grupo me encontrei”, são expressões comuns de serem observadas.
Já por parte da equipe de psicólogas, uma frase muito usada é: “Quando a boca cala, o corpo fala. E o nosso corpo fala ficando doente. Quando a boca fala, o corpo sara”.
Ao conversar com a reportagem, Marli Cofferri, de 53 anos, disse que se reencontrou no grupo. “Atualmente tenho trabalho, estou bem. Mas chegou uma época que guardava as coisas e não lembrava aonde. Não me maquiava, me senti sozinha, no fundo do poço. Hoje em dia não. Sou avó, muito feliz”, relata, citando que há cinco anos resolveu procurar um médico e também começou a fazer um tratamento psicológico.
Já Loreci Dulce Fortuna, de 54 anos, comentou que as dificuldades começaram há 10 anos com a separação do pai de seus filhos. Após algum tempo iniciou um outro relacionamento, contudo, o companheiro faleceu. “Eu sentia muita admiração e carinho. Foi um momento muito delicado, contudo, no grupo encontrei a coragem para continuar batalhando. Também sinto dores nas costas, estou afastada no trabalho por conta disso. No entanto, venho aqui e me fortaleço, ouvindo a história de outras pessoas também”.
A equipe
A equipe de trabalho é formada pelas psicólogas Lisiane Munaretto, Janete Lazzari, Leiliana Sita e Liandra da Silva, juntamente com psiquiatras: Anderson Madalozzo e Rimon Hauli e um clínico geral, Edanir Bichoff.
Como funciona
A rodaterapia acontece todas às quintas -feiras das 8h às 9h30min, no auditório da Secretaria Municipal de Saúde. Durante o grupo a equipe de psicólogas realiza o agendamento das consultas individualizadas e as pessoas são convidadas a conhecer e participar da rodaterapia, podendo retornar ao grupo sempre que sentir necessidade ou aguardar a consulta psicológica/psiquiátrica individual.
Atendimentos
O Ambulatório de Saúde Mental atende em média 600 pessoas/ mês entre os atendimentos individuais e os grupos realizados.
A equipe de psicólogas recebeu a capacitação ofertada pela Secretaria Municipal de Saúde no período de 2011-2012, e desde então os grupos acontecem regularmente com média de 60 participantes por grupo.
Sobre a Terapia Comunitária Integrativa
A terapia foi criada e aprimorada pelo psiquiatra Adalberto Barreto da Universidade Federal do Ceará, há mais de 20 anos a partir de sua experiência com os moradores da favela do Pirambu em Fortaleza-Ceará.
Rodaterapia é o nome do grupo desenvolvido a partir da terapia comunitária integrativa que é uma Política Pública de Saúde. A metodologia proporciona o encontro entre as pessoas para que conheçam melhor a si e à comunidade em que vivem, e juntos busquem alternativas para lidar com os problemas do cotidiano.
O alicerce está no princípio de que a comunidade possui seus problemas mas também desenvolve estratégias para lidar com a realidade. Diante disso, a terapia comunitária é um espaço de acolhimento para as pessoas que favorece a troca de experiências entre elas. Todos têm oportunidade de reconhecer os saberes adquiridos com a experiência de vida e a colaborar com o bem-estar, autoconhecimento, autoestima.
Na opinião da psicóloga e coordenadora do projeto, Lisiane Munaretto, a rodaterapia é um instrumento que permite a construção de redes sociais solidárias de promoção da vida e mobilizar os recursos internos das pessoas. “Valorizando a herança cultural, bem como o saber produzido pelas experiências de vida de cada um”, comenta.
A psicóloga Janete Lazarri salienta que, enquanto muitos modelos centram suas atenções na patologia e nas relações individuais, a rodaterapia se propõe cuidar da saúde mental em espaços públicos/coletivos valorizando a prevenção dos transtornos.
Já a psicóloga Leiliana Sita reforça que o espaço proporciona a promoção de encontros interpessoais “objetivando o resgate da identidade, a restauração da autoestima e da confiança em si, a ampliação da percepção dos problemas e possibilidades de resolução”, pontua.
A psicóloga Liandra da Silva cita que a rodaterapia é compreendida como um grupo de acolhida para quem chega ao serviço e ao mesmo tempo como um grupo de manutenção para quem desejar participar por tempo indeterminado.